UMA HISTÓRIA DO BRASIL QUE NÃO CONTAM NA ESCOLA.- de Américo Vespúcio ao AbareBebe

UMA HISTÓRIA DO BRASIL QUE NÃO CONTAM NA ESCOLA.

Flávio Calazans
Talvez a primeira coincidência mística envolvendo a cidade de Peruíbe seja que é exatamente sobre a Juréia que passava a linha dividindo o mundo entre Portugal e Espanha, pois foi na cidade espanhola de Valadolid , às margens do rio Duero, que em 1494 foi assinado o TRATADO DE TORDESILHAS, assinado pelos reis de Portugal-Don Alfonso V e pelo rei de Espanha, Don Fernando, ratificado por um PAPA, Rodrigo Bórgia ( Papa Alexandre VI) fixando a linha divisória meridional que passava sobre TAPIREMA ( em tupi-guarani, nhenhemgatú, a terra dos Tapir, das manadas de Antas) hoje Peruíbe (Tubarão feroz, Cação Bravo, que até hoje está no brasão heráldico da cidade) que desde 1492 contava dos mapas de navegadores espanhóis.

Foi em 1501 que Portugal enviou a esquadra de Gaspar de Lemos com o cartógrafo de Florença-Itália, Américo Vespúcio (Graças aos mapas dele o continente chamou-se América), dizem que deixaram degredados para testar a adaptação, (como dizem que outro navegador português, Diogo Cão, teria feito na África) e que foi nesta que o Bacharel de Cananéia, Mestre Cosme, teria sido abandonado no exílio entre tribos de índios tupinambás antropófagos.

Já em 1503, Gonçalo e Américo Vespúcio retornam em nova expedição explorando e mapeando, desta vez, instalando a primeira feitoria na Bahia, e levantando as bases dos piratas franceses e suas alianças comerciais com degredados portugueses e com as tribos canibais dos índios tupinambás-depois chamados de Confederação dos Tamoios.

Ainda em 1503 outra expedição cria fortins e arrenda terras para Fernando de Noronha e um grupo de cristãos-novos (judeus convertidos), comercializando pau-brasil pela tintura vermelha extraída dele, uma Economia de Extração, predatória, cortando árvores sem replantio e levando o Pau-Brasil até quase a extinção.

Além dos “Donos” da terra portugueses, também espoliavam o Brasil outros europeus de potências colonialistas: navios Piratas Franceses, Ingleses, Holandeses e Espanhóis vinham trocar Pau-Brasil por espelhinhos e colares com os índios tupinambás e outras tribos, a BIOPIRATARIA é um procedimento histórico no Brasil até hoje, desde o Pau-Brasil até hoje com nossas plantas e remédios indígenas sendo patenteados por laboratórios multinacionais (A Maioria de Conglomerados e Cartéis farmacêutico-químicos Norte-Americanos, Japoneses e Europeus) expoliando nosso BIOPATRIMÔNIO e nossas reservas genéticas.

Vale recordar que os ingleses roubaram mudas da árvore seringueira da amazônia, plantaram na ásia terminando o Ciclo da Borracha de 1910 em Manaus, Biopirataria inesquecível para todos os brasileiros; meu avô paterno era seringalista, dono de seringal nesta época, e teve de mudar de ramo de negócios.

Em 1505 os portugueses já tinham construído as primeiras fortificações militares no canal de Bertioga, desta que depois seria chamada de Capitania de São Vicente.

Foi só em 1525, que Martim Afonso de Souza, destacado soldado na guerra contra a França, casado em Castela com a espanhola Ana Pimentel, volta a Lisboa para escoltar a noiva de Dom João III, Infanta Catarina.

Em 30 de novembro de 1530, Martim é nomeado capitão e conselheiro da coroa, com poderes de vida e morte sobre seus subordinados com a missão de tomar posse do Brasil, esta era a resposta lusitana à conquista de Cortez no México, dizimando os Aztecas;

Só depois, em 1531, na Bahia, Martim encontra o misterioso Caramurú, Diogo Álvares Correia, vivendo faz 22 anos no Brasil e casado com a índia Paraguaçu, seu apelido-trovão, vem do seu arcabuz-arma de fogo como uma espingarda...talvez outro degredado..

Já em 1 de agosto de 1531 Martim chega a Cananéia, não encontra degredados alí deixados e, furioso, envia Pedro Anes a subir o rio Iguape, onde Pedro localiza e captura o misterioso Francisco Chaves, este que com expressiva retórica de homem culto convence Martim a armar uma expedição de 80 homems para ir procurar ouro, prometendo trazer 400 índios carregados de ouro e prata, expedição esta que nunca voltou, perdida em mistérios e lendas...

Todos os brancos encontrados por Martim dizem-se náufragos e é impossível conferir seus nomes ou a veracidade de suas histórias; ... ou se seriam degradados, exilados por crimes de opinião, por intrigas palacianas na corte ou judeus convertidos, cristãos-novos.

E em 1532 o Espanhol chega Pizarro ao Perú e rapidamente captura o Inca Atahualpa e conquista o império Inca; no Brasil, Martim, decepcionado e cansado pela demora em achar o El Dorado, no mesmo ano de Pizarro, 1532, funda vilas como São Vicente e Itanhaém, e pensando que a serra do mar seria a cordilheira dos Andes, segue João Ramalho, português degredado casado com a filha do caçique Tibiriçá no planalto paulistano, e lá em cima da serra, decepcionado com o enorme planalto (Não era a Cordilheira dos Andes Inca !!), Martim funda a vila de Santo André para não perder a viagem.

Fundar vilas, para a Civilização européia e portugal, era erguer um PELOURINHO, um tipo de estaca ou obelisco no qual as pessoas eram chicoteadas e punidas...

Então, após dois anos de fracassos, Martim passa a distribuir terras e incentiva a escravidão de índios para o plantio de cana-de-açucar como monocultura..

Quando Martim chegou e escreveu a “História Oficial” na qual ele próprio é o herói civilizador e fundador de cidades, na Ilha de Goyaó (São Vicente) já havia Mestre Cosme, o Bacharel de Cananéia, que em 30 anos de trabalho anteriores já havia construído um fortim de pedra, um porto, e era o patriarca letrado que aconselhava uma vila já construída com 12 casa, 70 habitantes, porcos, galinhas e muito abundantes plantações de hortaliças, sem contar os vinhedos, tudo pronto quando Martim chegou com suas milícias e tomou posse sob a força das armas.

São Vicente era um povoado organizado de europeus, todos “náufragos”(degredados?) casados com índias, e que forneciam barris de vinho, verduras e legumes frescos aos navios piratas franceses, ingleses, espanhóis e holandeses que chegassem comercializando, cheios de escorbuto e sedentos de leite, queijo, carne fresca , vinho e escravas índias para alugar por uma noite (destas gerações de escravas nasceram tantos caiçaras de olhos claros, olhos holandeses, franceses).

Assim sendo, do mesmo modo que muitos outros pioneiros, como Mestre Cosme, os desbravadores exilados que desenharam a “Alma Brasileira”, o “Jeitinho Brasileiro”, “Jogo de Cintura” conciliador foram todos metodicamente apagados e esquecidos, os injustiçados da “História Oficial” do Brasil.

Somente em 1534 Martim consegue finalmente sair do Brasil, nomeado Capitão Mor do Mar das Índias e partindo para massacrar os indianos; sua esposa espanhola, Ana Pimentel, passa a governar via cartas a capitania de São Vicente, Vilarejo destruído por maremoto em 1536, quando o porto é transferido para terras de Brás Cubas, perto do Hospital Santa Casa de Todos os Santos, criando o maior porto da América Latina até o Século XXI, Santos...

Com o fracasso das Capitanias Hereditárias, em 1548 Don João III atende ao pedido de Martim Afonso de Souza e nomeia o primeiro governador geral do Brasil, Tomé de Souza, PRIMO de Martim Afonso de Souza (deixando o Brasil como um negócio de família, origem do nepotismo e apadrinhamentos), que chega acompanhado dos primeiros padres jesuítas.

Os Jesuítas chegam em 1548 chefiados pelo Padre Manuel da Nóbrega, então com 32 anos, e entre os padres, o lendário Leonardo Nunes, o “Irmão do Vento” “Abarebebê” “Padre Voador”, apelido devido a velocidade com que deslocava-se, sempre apresado e estressado, entre as aldeias, mesmo durante chuvas fortes, dia e noite marchando incansável, em uma disciplina militar jesuíta, catequisando índios carijós e caiuás ao pé da Serra de Itatins (depois Fazenda São João) em Tapirema (Peruíbe).

O “Abarebebê” foi o primeiro em muitas coisas:

Primeiro libertador de escravos índios, primeiro professor (latim e português), fundador da primeira biblioteca, primeiro médico e farmacêutico, fundador do primeiro hospital, primeira escola, primeira igreja católica, oficiou a primeira missa do estado de São Paulo, fundador do colégio da futura cidade de São Paulo, etc..

Em 1549 chegam de Veneza os 3 navios italianos com os fugitivos aliados e parentes do falecido Doge de Veneza, Itália, no porto de Santos, primeiros colonos imigrantes-os irmãos Adorno; neste ano o “Abarebebê” reforma o antigo forte, funda o vilarejo de Peruíbe, costrói a escola e capela, o boticário coletando ervas medicinais indígenas, no que hoje é conhecido como “Ruínas do Abarebebê”, em uma colina de onde vê-se a “Ilha Grande” na divisa com o Guaraú, o “Porto dos Escravos” que faz a reputação internacional de São Vicente como terra escravagista.

Por todo este período dos últimos 20 anos surgiu outra lenda, o judeu convertido, cristão-novo Pero Correia, senhor das sesmarias de Guaraú e Peruíbe, armador-proprietário de navios, comerciante muito bem sucedido, especialista em escravizar indígenas que prendia no depósito da sua “Ilha Grande” , Pero Correia era um nome temido em toda Capitania de São Vicente , suas bandeiras de captura de “peças”, os índios-negros da terra, eram famosas pela extrema crueldade; gerando uma fortuna incalculável com a venda de escravos nos leilões e exportação de ouro e pau-brasil.

Pero Correia era dono do único estaleiro de navios costeiros de baixo calado, situado no Japuí, chamado de “Porto das Naus” e era dono de uma frota de naus com seu sócio também cristão-novo, Fernão Morais, ambos originários de Portugal, do Algarve, chegando trazidos integrando a comitiva de Martim Afonso de Souza em 1531 .

Pero também tinha garimpos de ouro na Serra do Itatins (o gigante de pedra adormecido na Juréia) e navios estrangeiros aportavam escondidos no Guaraú para levar de contrabando ouro, Pau-Brasil e escravos índios; chegando também Navios Negreiros que contrabandeavam escravos negros capturados na África e levados de canoa para fazendas em São Paulo ( que era então chamada de Piratininga=peixe seco, terra de Caipiras=aqueles que moram no mato, isolados, o contrário dos Caiçaras=paliçada, os que moram dentro dos muros de madeira das aldeias frente ao mar, em contato com piratas de várias nacionalidades).

AS tribos indígenas com pessoas capturadas como escravas tornaram-se arredias e desconfiadas com os brancos, chegando a até mesmo atacar e flechar os invasores de seus territórios, tribos como: Carijós, Caiumas, Tapanhums, Misomonius, Gayanases, Tupinambás e até mesmo alguns antigos colaboracionistas Tupiniquins.

Foi então que, em 1550, em uma caçada de novos índios para escravizar nas serras cobertas de neblina do guaraú, uma noite Pero Correia vê uma aparição luminosa que o toca muito profundamente, uma experiência mística que posteriormente o “Abarebebê” explicou-lhe tratar-se de Nossa Senhora.

Assim, Pero Correia converte-se e vira diácono e padre jesuíta, passando a colaborar com a catequese como intérprete por conhecer bem diversos dialetos indígenas (tal qual o Mestre Cosme-Bacharel de Cananéia, outro poliglota e pioneiro da tradução do nhenhemgatú que Anchieta depois sistematiza numa “Gramática Tupi-Guaraní ” e escreve peças de teatro de catequese em tupi para os curumins atraídos pelos meninos órfãos trazidos de Portugal para os colégios, iscas vivas que depois crescem, casam com as cunhãs e fundam as famílias quatrocentonas paulistanas, os Bandeirantes).

Pero patrocina a construção de igrejas como o hoje “ Ruínas do Abarebebê”e cede seus barcos para os jesuítas irem ao Paraná e começar o projeto que depois cresceria para o interior e seria chamado de “Sete Povos das Missões”.

Escreve livros como “Suma da Doutrina Cristã” em tupi-guarani para catequese.

Pero é considerado um mártir da fé cristã, “o primeiro mártir jesuíta das américas” pois em uma missão em Iguape-superagui em agosto de 1554, faz um sermão a um castelhano que vivia com várias esposas índias, e este chama os índios Guayanazes-Carijós que reconhecem Pero Corrêia como aquele que capturou e escravizou seus irmãos e filhos, crivando-o de flechas, assim falecendo flechado como São Sebastião, falece também com ele o irmão João de Souza, ambos não reagiram, ficando ajoelhados rezando ( Mais outra das coincidências: São Paulo perseguia os cristãos e depois virou um defensor deles e até apóstolo sem ter conhecido Jesus, do mesmo modo, após a visão o convertido Pero passou de escravagista a libertador de índios).

Toda a herança , uma fortuna, -talvez a maior do Brasil-, de Pero já tinha sido doada à “Companhia dos Meninos de Jesus de São Vicente”, entidade jesuítica criada para abrigar menores filhos de índios capturados e vendidos como escravos e órfãos brancos vindos de Lisboa (muitos bastardos filhos de mãe solteira ou prostitutas dos orfanatos de Lisboa e Porto) e distribuídos pelos colégios como o de São Paulo como isca de catequese de curumins selvagens.

Só em 1553, o “Abarebebê” seguiu para Santos embarcado com o próprio dono do navio que ia à Bahia e voltava, Pero Correia, e ambos recepcionaram e trouxeram os noviços jesuítas recém-chegados de Lisboa, entre eles o jovem noviço José de ANCHIETA.

Em janeiro de 1554 Leonardo Nunes “Abarebebê” e seu noviço Anchieta sobem a Serra com ordem do superior padre Manuel da Nóbrega e fundam o colégio de São Paulo, primeira povoação.

E em 30 de junho de 1554, em uma tempestade ocorre o naufrágio no qual todos no navio morrem e assim desaparece o “Abarebebê”, (mesmo ano da morte de Pero Correia, um mês antes; mais outra coincidência) ; e Anchieta foi o continuador do trabalho pioneiro do “Abarebebê” tanto no colégio de São Paulo quanto pacificando tribos em pé de guerra, e Anchieta fica conhecido como “Pagé-Guassú” o grande sacerdote-curador, citado em todos os livros de História, enquanto o Abarebebê foi esquecido e injustiçado, apagado da memória nacional, da “História Oficial” tal qual Pero Corrêia.

Na antiga casa do recém-falecido Pero Correia, no Japuí, ainda em 1554, Anchieta reforma a construção e funda a Igreja Nossa Senhora das Naus (Queimada pelos Holandeses só em 1614) e junto ao costão de Pernambuco, Anchieta manda construir “O Poço” uma reserva de peixes, um muro onde os peixes ficavam presos na maré vazante, colhidos pelos índios, que ainda pode ser visto até hoje na maré vazante, surgindo daí o nome “Itanhaém”, ou panela-bacia de pedra, hoje nome da cidade que foi a segunda vila fundada por Martim no Brasil em 1532, Conceição , junto com a primeira, São Vicente.

E em 1563 a Confederação dos Tamoios declara a guerra aos brancos.

Só em 1565 Anchieta sai do litoral paulista definitivamente, nunca mais retornando.

A região permanece esquecida e, devido a isto, preservada.

E apenas em 1950 surge a especulação imobiliária com prédios de apartamentos, condomínios fechados e casas de veraneio, todos de paulistanos de classe média emergente.

Peruíbe só é emancipada e elevada a município em 18 de fevereiro de 1959, sendo reconhecida como estância balneária em 22 de junho de 1974.

Bibliografia:

História Secreta do Brasil:

EKMAN, Maya. Peruíbe, história das suas origens, lendas e contos.Peruíbe: Editora A Busca [1988].

PAES LEME, Pedro Taques de Almeida. História da Capitania de São Vicente. [São Paulo], [melhoramentos], [s.d.].

RODRIGUES, Olao. Cartilha da História de Santos.Prefeitura Municipal de Santos, 1980.

SÓ, José Carlos. Itanhaém-História e Lendas. [edições Loyola], [1995].

BIOPIRATARIA:

DEL NERO, Patrícia Aurélia. Propriedade Intelectual: a tutela jurídica da biotecnologia.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

HAWKEN, Paul, et alii. Capitalismo Natural: criando a próxima revolução industrial. São Paulo: Cultrix .[1999].

RIFKIN, Jeremy. O Século da Biotecnologia.São Paulo: Makron Books, 1999.

texto retirado do livro de CLAZANS ECOLOGIA E BIOMIDIOLOGIA editora Plêiade 2002

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